será que você amou mesmo?

o amor é complexo.

trago polêmica.
tenho ouvido muito por aí reclamações complexas sobre relacionamentos. escrevo essa matéria, num intuito genuíno de pensarmos um pouco para fora de nossos umbigos - afinal, na era do individualismo, da partilha seletiva e dos ouvidos desatentos à escuta, proponho uma trégua na costumeira rigidez e inflexibilidade. vem comigo?

antes de mais nada,
isso aqui não é um convite ao amor romântico, ok?

o amor tem sido pensado, estudado, tentado se reformular pela cabeça dos que pensam, por vezes sem se permitir sentir.
o amor tem sido tema de coach, o amor tem sido um lugar de lacrar, a conquista tem sido uma competição, o amor está moldado nos tempos que vivemos - um carrossel no instagram, um story meia boca.
estou cansada de colocar um formato, um rosto, um estereótipo, ou como gostaria que o outro fosse.
estamos preocupados em acertar, estamos querendo tirar dez, estamos desesperados por relacionamentos saudáveis - e isso não é uma crítica e sim uma ansiedade. amor não é matemática, gente.
precisamos primeiro assumir,
que o que a gente quer é ser amado.
sobretudo, ser amado como somos, sem demanda. sem ter que mudar tudo em mim, sem ter que brigar para poder continuar sendo o que somos.
o medo da desaprovação está posto em cada um de nossos movimentos.


o amor romântico deturpa nossa condição ao afeto.
a extrema racionalização dos sentimentos também.

amor requer coragem de assumir alguns riscos.
amor pede vulnerabilidade. tentativa e erro. aceitação de como você entende o amor e suas necessidades e respeito por como o outro ama, bem como as necessidades dele. claro, desde que isso não atropele questões óbvias como uma falsa moralidade imposta por valores distorcidos -
ex: minha avó sempre fez tudo para meu avô, essa é minha referência de amor e é assim que eu quero que seja. 
não né.
sinto muito pela sua avó.
mas comigo não.

o que estrou trazendo aqui é outro espectro.
será que não estamos demais preocupados com o meme da "terapia tá em dia"? esperando que o outro venha pronto para gente? como se houvesse um modo certo de ser e de se relacionar?

terapia em dia é importante,
sem dúvida.

foi-se o tempo em que eu desaprovava meus comportamentos e cedia a autoridade que persistia a me fazer desacreditar na possibilidade de eu ser, assim, do jeito que sou.
acontece que, nas famílias, seja qual for a composição dela, o afeto se desenha de maneiras divergentes. e cada adulto é o resultado do que a infância te permitiu ser.
alguns tiveram vivências melhores, outros piores. mas, cada uma dessas experiências deve ser respeitada.
terapia em dia para construir um eu melhor dentro do que foi posto. mas aí é que está - depois de 2 anos de terapia, ninguém ainda está 'pronto'. acontece que nunca estaremos pronto. cada relação vai despertar em nós versões específicas nossas, e todas, todas elas, vão precisar de aperfeiçoamentos.

enquanto a gente esperar estar pronto e o alguém idealizadamente 'pronto',
o amor nunca,
nunca
vai chegar.

aquelas crianças cujo amor só existia se comesse tudo ou se respeitasse todas as regras que muitas das vezes, nos eram rígidas. crescem então, adultos condicionados a regras que funcionam como general interno. não cedendo um milímetro. tentando... tentando muito falar de amor e da imensidão das águas dos oceanos. mas ainda sim, regrados por um general interno que não permite que desfrutemos da nossa real identidade e dessas águas.
esse aspecto nos faz ser confiáveis perante ao olhos do outros, porquê na realidade estamos tentando fazer alguém nos achar confiáveis a ponto de merecermos atenção. não era assim quando criança? cumprir tudo pra merecer estrela na testa?
esse comportamento faz com que não relaxamos quanto ao desfrute do que conquistamos com o nosso tempo de serviço ao aperfeiçoamento de nós e, o que oferecemos ao mundo.
tempo de se amar e de perseverar consigo, conseguindo ser, sem tanta tensão na aprovação alheia.
você não precisa ser perfeita pra ter atenção de alguém.
nem mesmo de um pai e de uma mãe e principalmente, quando esses estão transmitidos em outros corpos como chefes, companheiros e companheiras.

eu te pergunto: você está procurando uma relação ou um amor?
porque o amor, ah, o amor, o amor é outra coisa.